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Empresas não amadurecem em segurança por acidente.
Elas amadurecem por decisão — e essa decisão é cultural, não técnica.

No entanto, em muitas organizações, a cultura predominante é reativa: a segurança só ganha atenção quando algo dá errado. O firewall só é atualizado após um vazamento. A senha forte só vira política depois que alguém cai num phishing. O investimento só vem depois da multa.

Essa mentalidade tem um custo alto — e nem sempre visível no curto prazo.


O que é uma cultura reativa em segurança?

Uma cultura reativa em segurança da informação é aquela em que as ações são motivadas por eventos negativos. O padrão é claro:

  • Negligência no dia a dia, seguida de pânico após um incidente;
  • Decisões táticas e isoladas, sem conexão com a estratégia do negócio;
  • Foco em apagar incêndios, não em construir resiliência.

Esse comportamento é fácil de identificar. O difícil é perceber seus impactos sistêmicos — porque eles não aparecem imediatamente no balanço ou nos dashboards.


O ciclo da reatividade

Empresas com cultura reativa normalmente seguem um ciclo que se repete:

  1. Negligência silenciosa: falta de atenção a riscos conhecidos, ausência de planejamento e cultura de “isso nunca vai acontecer com a gente”.
  2. Incidente crítico: um ataque, vazamento, fraude ou exigência regulatória que exige resposta imediata.
  3. Resposta emergencial: contratação apressada de fornecedores, compra de ferramentas sem integração, projetos corridos.
  4. Sensação de “problema resolvido”: a atenção retorna ao core business, a segurança volta à invisibilidade.
  5. Repetição: um novo incidente, quase sempre agravado pelos mesmos pontos cegos.

Esse looping consome recursos, desgasta equipes e adia o amadurecimento real do programa de segurança.


Impactos ocultos da cultura reativa

O maior problema da cultura reativa é justamente sua natureza silenciosa. Os danos não são sempre explícitos — mas são profundos:

🧱 Ambientes frágeis

Soluções desconectadas, controles redundantes, ausência de governança centralizada. A infraestrutura técnica pode até parecer robusta, mas é instável.

🧠 Equipes desmotivadas

Profissionais de segurança acabam sempre em modo “crise”. Não há espaço para inovação, formação, melhoria contínua. Isso gera turnover, burnout e perda de conhecimento institucional.

📉 Orçamento mal aplicado

Recursos são direcionados ao que “queimou” por último, não ao que mais impacta o risco. Ferramentas são subutilizadas, projetos viram gastos sem ROI claro.

🧩 Riscos não percebidos

Quando a gestão é reativa, a organização só enxerga o que já causou dano. Os riscos emergentes e as ameaças silenciosas permanecem ignorados — até que seja tarde.


Exemplos reais (sem nomes)

  • Caso 1 – Setor público: após um ransomware, um órgão liberou verba emergencial para montar um SOC. Mas sem cultura, sem integração e sem métrica, o SOC virou apenas mais um contrato com dashboards que ninguém lia.
  • Caso 2 – Indústria: uma fábrica adotou MFA só depois de perder acesso ao ERP por uma semana. Se o investimento tivesse vindo antes, a perda de produção — e de reputação — poderia ter sido evitada.
  • Caso 3 – Finanças: uma fintech preferiu acelerar o crescimento sem olhar para compliance. Quando recebeu notificação da autoridade reguladora, gastou o dobro tentando se adequar sob pressão, com retrabalho e desgaste institucional.

Por que isso acontece?

Cultura reativa é resultado de uma combinação perigosa:

  • Falta de patrocínio estratégico: quando o topo não entende segurança como fator de continuidade do negócio, ela vira apêndice da TI.
  • Ausência de indicadores claros: sem métricas, segurança é vista como “invisível” — até que doa.
  • Desconhecimento dos impactos financeiros do risco: poucas empresas calculam o custo real de uma parada, de uma fraude ou de um incidente de imagem.

Caminhos para romper o ciclo

Mudar a cultura não é rápido — mas é possível. Algumas ações essenciais:

1. Envolver a alta liderança

Segurança precisa deixar de ser um projeto da TI e virar pauta da diretoria. Mostrar cenários reais, custos potenciais e ganhos tangíveis ajuda a virar a chave.

2. Estabelecer governança contínua

Criar fóruns, políticas vivas, rituais de acompanhamento e integração com outras áreas críticas (jurídico, RH, financeiro, riscos).

3. Mapear e priorizar riscos

Investir onde o impacto é maior. Isso evita desperdício e direciona o orçamento com inteligência.

4. Medir e comunicar

Criar indicadores que façam sentido para o negócio. Métricas de impacto, tempo de resposta, exposição, entre outros.

5. Educar constantemente

Programas de awareness precisam ser contínuos, não pontuais. A mudança cultural vem do exemplo, da repetição e da prática.


Conclusão

A cultura reativa não é apenas um atraso — é um risco estratégico.
Empresas que só investem após o dano estão sempre um passo atrás das ameaças.

Maturidade em segurança é um processo de construção, não de reação.
Começa com visão, passa por alinhamento e se consolida com consistência.

A pergunta não é “o que faremos quando algo acontecer?”
Mas sim: “o que estamos fazendo para que isso não aconteça — ou que, se acontecer, estejamos prontos?”

Segurança não é uma resposta. É uma postura.

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